segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Existia esse lugar

Existia esse lugar. Não tinha nada de chamativo por fora, é verdade. Talvez por dentro também não tivesse não fossem aquelas mil cores apoiadas nas prateleiras, cruelmente envidraçadas. Não fossem também aquelas essências misturadas, aquelas todas, unidas em uma só. Estonteante. Sem isso, quem sabe, não haveria nada de chamativo no lugar.

Existia também esse rapaz, o Tim. Diziam que era doido de pedra. Mais doido que uma pedra! E quem mais doido que uma pedra? Que de tudo vê e de nada fala? Pois ele era um daqueles que andam para frente, e a cada passo você tem certeza que nada ficou pra trás. Ele conseguiria carregar o mundo naquele olho e naquele jeito de quem sabia mais que dizia.

Um dia aconteceu o inesperado. Ou melhor, o temivelmente esperado. O inevitável esperado que chamavam de inesperado. Enfim, o fato é que aconteceu.

Não foi um eclipse lunar, tampouco um solar, apesar do alvoroço que causou em dois universos inteiros terem sido um tanto quanto maior que estes. Ah, foi um eclipse de Tim e do Lugar. Dois mundos, se cruzando, frente a frente, como gatos arredios que esperam a hora do combate. E quando o rapaz colocou seu pé na soleira do estabelecimento, uma fusão ocorreu. Poderíamos dizer que foi mais vulgar que o célebre Big Bang, é fato. Mas nunca de menor repercussão ou resultado.

Era, sem dúvida, uma loja maravilhosa. Sim, uma loja. Uma perfumaria, mais precisamente. Perdida e abandonada. No entanto, Tim sabia muito bem que o perdido era para ser achado e o abandonado para ser acolhido. E a perfumaria em troca lhe daria o segredo do universo, escondido atrás de um balcão ou misturado a alguma essência de cravo ou rosa campestre. Cantigas com a voz do garoto foram feitas. Melodias com a paixão dos objetos trazida à tona.

Foi nesse dia então que o rapaz louco decidiu morar no lugar. Passar cada dia de sua existência inalando o perfume e admirando as cores. Descobrindo o mundo todo entre quatro paredes. Descobrindo seu mundo.

Os anos se passaram, um por um, cada vez mais velozes. Ultrapassaram-se como maratonistas que superam uns aos outros. Enfim antes que Tim pudesse notar sua barba já havia se tornado cinza, tal como sua mente.

As cores da loja já não provocavam surpresa ou espanto. O prazer havia acostumado. O perfume já não podia sentir. Era uma essência por demais processada, a tal ponto que oxigênio puro e a mais exótica planta teriam o mesmo sabor para ele. Menos que nada. Tédio.

Confuso, temente, desolado, frustrado. Assim seria descrito naqueles dias. Ou ao menos o que havia restado dele seria.

Decidiu, com a vasta sabedoria do louco, abandonar o seguro e jogar-se novamente no mundo. Acompanhado apenas de suas experiências, histórias. Trocar pão por sorriso.

Correu, andou, andou...an-dou.

Exausto, suado, abominavelmente feliz, caiu no chão. Braços abertos, mente escancarada. Qualquer coisa que viesse seria absorvida, ponderada sem cuidado.

Fechou os olhos...

Existia esse lugar.

Existia também esse rapaz, o Tim.

Uma essência adocicada encheu sua mente de nostalgia e seus olhos de lágrimas.

Uma essência que só podia ser sentida por ele, vinda do canto mais particular de sua mente completou o lugar.

É, era verdade então.

Tinham certas coisas que deveriam ser deixadas no passado para serem sentidas no presente.

E isso, bons amigos, foi a palavra de um louco.



Gabi.

Nenhum comentário: